sábado, 8 de novembro de 2014
Malabarismo
Deve-se reconhecer que o senador Aécio Neves é um exímio manejador de palavras, qualidade que revelou ao país durante a campanha eleitoral. Essa habilidade, que lhe permitiu durante os debates fugir das perguntas – e transferir para os petistas a pecha de mentirosos e infames – transformou-o num grande sofista, capaz de torcer a seu favor os fatos mais desfavoráveis. Nesta última terça-feira, no entanto, ele se superou ao afirmar que “perdeu vencendo”, enquanto Dilma “venceu perdendo”. Essa acrobacia verbal, por mais incrível que possa parecer, acabou convencendo um magote de cabeças de vento de que ele foi, efetivamente, o grande vencedor das eleições de 26 de outubro último.
O candidato derrotado à Presidência da República reapresentou –se ao Senado em grande estilo, como se fosse realmente o vitorioso, assediado por militantes tucanos e afirmando que “chego hoje ao Congresso para exercer o papel que me foi delegado pela grande maioria do povo brasileiro – 51 milhões de votos”. E acrescentou: “Vou ser oposição sem adjetivos”. Com seu malabarismo verbal ele continua sofismando: os 51 milhões de votos que recebeu não representam a maioria dos eleitores, pois se assim fosse teria sido eleito. A maioria dos votos foi dada à presidenta Dilma, que foi reeleita com mais de 54 milhões de sufrágios, ela, sim, a grande vencedora.
O senador tucano parece ter se convencido de que, por conta da sua votação, passou a ser o grande líder da oposição. Esqueceu que esses votos não foram dados realmente a ele por causa dos seus belos olhos ou dos seus sofismas, mas pelo fato de ter sido o único oponente no segundo turno. Como no Brasil não é o povo que escolhe os candidatos, mas os partidos, os eleitores que não queriam votar em Dilma só tinham ele como opção no segundo turno. Por isso, os que não queriam nem ele ou Dilma, num total de mais de 37 milhões, preferiram votar em branco, anular o voto ou simplesmente não comparecer às urnas. A abstenção foi de 21,10%.
Os votos de Aécio foram os que ele recebeu no primeiro turno, ou seja, 34 milhões, menos três milhões do que o número de eleitores que decidiu não votar em ninguém no segundo turno. Isso significa que os 17 milhões de votos que recebeu a mais no segundo turno, portanto metade da sua votação no primeiro, foram de eleitores de Marina Silva em sua grande maioria. A outra parte do eleitorado da ex-senadora acreana preferiu migrar para Dilma, que teve 43 milhões de votos no primeiro turno. O senador mineiro, como é fácil perceber diante desses números, está se arvorando numa liderança que, na verdade, está muito dividida.
Percebe-se, ainda, que a diferença de comportamento entre ele e o senador José Serra, também tucano, é bem evidente. Nas eleições presidenciais de 2010 Serra obteve 43 milhões de votos, contra 55 milhões dados a Dilma, mas nem por isso se pavoneou da votação ou se arvorou como líder da oposição. Como único candidato oponente no segundo turno daquele pleito, o senador paulista obviamente, tal como aconteceu este ano com Aécio, recebeu os votos dos que não queriam votar em Dilma. Isso não significa, portanto, que aqueles 43 milhões de votos foram dele, mas do opositor da candidata petista. Na verdade, os votos deles mesmo foram os que receberam para senador: Aécio obteve 7 milhões em 2010, em Minas, e Serra 11 milhões este ano, em São Paulo.
Tem-se a impressão, por outro lado, que Aécio, diante dos salamaleques que estão fazendo para ele, acredita ter se credenciado como candidato de novo á Presidência da República em 2018. Não parece difícil prever que ele não conseguirá manter essa posição durante os próximos quatro anos, até porque dentro do seu próprio partido existem outros candidatos em potencial, como o governador Geraldo Alkmin e o senador José Serra que, a exemplo dele, Aécio, também foram derrotados pelo PT. Além deles, a ex-senadora Marina Silva igualmente pretende disputar o Palácio do Planalto naquele ano, montada na votação de 22 milhões que obteve este ano, enquanto o PMDB, rebelado contra a aliança com o PT, já acena com candidatura própria também em 2018. Sem falar em Lula. O cenário para a eleição presidencial naquele ano, portanto, será bem diferente do atual.
É preciso levar em conta, ainda, a performance da presidenta Dilma Roussef neste segundo mandato. Se ela fizer um governo ruim estará adubando o terreno para a oposição, que certamente virá muito forte dentro dos próximos quatro anos, mas se, ao contrário do que esperam os profetas do pessimismo, fizer um bom governo, promovendo as reformas reclamadas, mantendo a inflação em baixos níveis, estimulando o crescimento e ampliando os programas sociais terá pavimentado a estrada para Lula. Conclui-se, assim, que Aécio terá de sofismar bastante para, pelo menos, ser ungido novamente pelo seu partido como candidato em 2018. Afinal, o caminho até lá é longo e acidentado.
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