segunda-feira, 16 de maio de 2016
Possi vel renúncia
Há uma evidente preocupação dos integrantes do novo governo em acelerar, no Senado, o processo de julgamento da presidenta afastada Dilma Roussef, de modo que a decisão seja tomada bem antes dos 180 dias previstos na Constituição. E essa preocupação se explica: primeiro porque, como interino, o presidente em exercício Michel Temer não tem a força necessária para fazer tudo o que pretende, sobretudo porque não tem legitimidade, e, segundo, porque em seis meses corre o risco de provocar descontentamentos entre os senadores, com a consequente mudança de votos que poderá por um fim no seu sonho presidencial. Afinal, a julgar pelo número de sufragios que lhe permitiu sentar na cadeira presidencial (55 x 22) ele ficou pendurado em apenas três votos, uma frágil maioria, para continuar Presidente até 2018. E por conta disso, no primeiro dia do novo governo alguns ministros já emitiam sinais de insegurança diante das primeiras críticas, surgidas no Senado, entre os que votaram a favor do impeachment.
Na verdade, tudo leva a crer que o processo não ultrapassará os 90 dias, devendo estar concluído até setembro vindouro, quando o ministro Ricardo Lewandowski, que presidirá o julgamento no Senado, deixará a presidência do Supremo Tribunal Federal, devendo ser substituído pela ministra Carmem Lúcia. O próprio Lewandowski, aliás, já manifestou o desejo de encerrar a sua tarefa no Senado antes do término do seu mandato de presidente do STF. E enquanto isso não acontece, Temer vai governar pisando em ovos, caminhando com muito cuidado para não pisar nos calos de algum senador ou desagradar algum partido, o que significa andar no fio da navalha. Esse é o grande problema de quem não chegou à Presidência pelo voto popular, sem força para impor-se, o que o torna refém de todos os que podem influenciar o voto dos senadores e, consequentemente, o resultado do julgamento. Encurtar o tempo do processo, portanto, reduz a possibilidade de acontecer algo que possa mudar o jogo.
Mas isso é apenas uma pequena amostra das suas enormes dificuldades como Presidente sem legitimidade. Ele também é refém do PSDB, que pediu ao Tribunal Superior Eleitoral a cassação do mandato da chapa Dilma-Temer, alegando uma série de irregularidades. E como o TSE é agora presidido pelo ministro Gilmar Mendes, um tucano que há muito deixou de esconder as penas, não parece muito difícil adivinhar a sua posição. Embora tenha recentemente aventado a possibilidade, muito difícil, de separar Temer de Dilma no processo em curso no TSE, obviamente já maquinando uma fórmula capaz de cassar apenas o mandato da Presidenta afastada, Gilmar terá um trunfo nas mãos para impedir que o Presidente interino faça algo que desagrade o ninho tucano. O guru do partido, aliás, o ex-presidente Fernando Henrique, já afirmou que o governo é do PMDB e não do PSDB, sinalizando, inclusive, a possibilidade de abandoná-lo caso não cumpra as exigências tucanas. Uma carta de seguro para o caso de dar tudo errado.
O fato é que, consciente do caminho torto que palmilhou para chegar à Presidência, Temer já dá mostras de fragilidade. Ele parece perdido em meio às críticas de todos os lados, inclusive de seus aliados golpistas. E depois de recuar da extinção do MinC, já recuou do recuo, mantendo a cultura no MEC, cujo titular, Mendonça Filho, está sendo rejeitado até pelos que aprovaram o golpe. Além disso, a reação de alguns países latino-americanos, que se recusam a reconhecê-lo como presidente do Brasil, amplia o seu isolamento. A situação está ficando tão difícil que integrantes do seu governo já falam em pedir ajuda ao ex-presidente Lula, assim como alguns jornalistas que defenderam o golpe, como Eliane Cantanhede, que já fazem apelo por uma trégua, um gesto que poderia ter sido feito antes da aprovação do impeachment pela Câmara. E a oposição ao novo governo, afora manifestações populares isoladas, ainda nem começou a dar sinais de vida no teatro político, o que poderá acontecer já nesta semana com ações na Justiça contra a posse de alguns ministros sob investigação. E que não são poucos.
A insegurança do Presidente interino, já percebida logo no seu discurso de posse, poderá agravar-se no decorrer dos dias, sobretudo quando anunciar o seu programa de privatizações, já desenhado pelo seu escudeiro Moreira Franco – e avalizado pela Globo – que deverá desencadear reações mais intensas em todo o país. Pelo que se conseguiu observar nestes primeiros momentos do novo governo, Temer não parece ter estrutura para resistir às pressões, sobretudo dos próprios aliados, mesmo tendo o apoio da imprensa, o que poderá encurtar a sua gestão com uma difícil mas não impossível renúncia antes da conclusão do julgamento de Dilma pelo Senado. Se tal acontecer, estará escancarado o caminho para eleições presidenciais em outubro deste ano, junto com o pleito municipal, o que se apresenta como a melhor solução para tirar o país dessa situação. Afinal, só um governo eleito pelo povo, em eleições livres e limpas, terá legitimidade e forças para tomar as medidas necessárias, incluindo as reformas reclamadas, para recolocar o Brasil nos trilhos do desenvolvimento. E qualquer que seja o eleito, certamente aproveitará as lições deste episódio para não cometer os mesmos erros.
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