terça-feira, 19 de julho de 2016

Nada mudou na Câmara

Trocaram seis por meia dúzia. A eleição do deputado Rodrigo Maia para presidente da Câmara em nada alterou a posição daquela Casa em relação ao governo interino de Michel Temer. Na verdade, a posição seria a mesma se o deputado Rogerio Rosso fosse o eleito. A única diferença está relacionada apenas com o deputado Eduardo Cunha, pois Maia parece um pouco menos submisso a Cunha do que Rosso, o que significa que o comando do Legislativo sofrerá menos, a partir de agora, a influência do ex-presidente da Casa. Para Temer, no entanto, nada mudou: ele continuará recebendo o apoio de que precisa para aprovação dos projetos que contrariam os interesses do povo brasileiro, fazendo o desmonte das conquistas sociais dos governos petistas. Prova disso é que, logo após a proclamação do resultado da eleição, o novo presidente da Câmara afirmou que vai dar prioridade, dentre outros, ao projeto de reforma da Previdência e à proposta que altera as regras de exploração do pré-sal, ambos fortemente rejeitados pela população. Confirmando a sua experiência de raposa política Temer, espertamente, jogou pesado em duas frentes na eleição para a presidência da Câmara Baixa: dividiu o seu apoio entre Rosso e Maia, cabalando votos para os dois nos conchavos com os demais partidos, em especial o PSDB, que votaram pelo impeachment de Dilma Roussef. Ele sabia que a oposição não tinha votos suficientes para eleger o presidente mas, temeroso de uma surpresa com a candidatura do deputado Marcelo Castro, ex-ministro da Saúde do governo Dilma, preferiu não correr riscos e trabalhou intensamente nos bastidores em favor, principalmente, de Maia, pois queria aproveitar a oportunidade para também livrar-se da hoje incômoda companhia de Cunha. Os votos dos tucanos foram decisivos para a eleição de Maia que, reconhecido, seu primeiro ato como novo presidente da Câmara foi agradecer ao senador Aécio Neves, que volta a ter mais força na Casa. Quem cometeu um grande pecado foi a esquerda, que podia ter marcado posição votando, por exemplo, na deputada Luiza Erundina e, depois, negociando os seus votos no segundo turno, pois sem dúvida seria o fiel da balança. Seria possível comprometer o eleito com determinadas reivindicações da oposição. Não há dúvida, porém, de que o derrotado foi Eduardo Cunha que, apesar de todas as manobras no Conselho de Ética e na Comissão de Constituição e Justiça, não vai conseguir impedir a cassação do seu mandato. No máximo obteve um adiamento da decisão para agosto, mas a cassação pelo plenário da Casa deverá acontecer um pouco antes do julgamento pelo Senado do impeachment de Dilma. Se ela for definitivamente afastada Cunha nem poderá comemorar o resultado da sua maldade no exercício da presidência da Câmara, porque ele também terá sido defenestrado do Legislativo. A diferença da sua situação, em relação à da Presidenta, é que ele poderá ser preso após a perda do mandato, pois ficará sem foro privilegiado e seus processos deverão passar para as mãos do juiz Sergio Moro, na Operação Lava-Jato. Quanto a Dilma, ela não responde a nenhum processo pois nunca foi acusada de corrupção, transformando-se em vítima de um golpe político sem crime. E, ao contrário dele, ainda tem a possibilidade de voltar ao Palácio do Planalto, bastando para isso que pelo menos seis senadores votem com honestidade, conscientes da sua inocência. O golpe, antes negado pelos adversários da presidenta Dilma Roussef sob a alegação de que o impeachment está previsto na Constituição, foi inteiramente desmascarado por peritos do Senado e do Ministério Público, que demonstraram a inexistência das pedaladas fiscais que serviram de base para o afastamento da Presidenta eleita. Sem pedaladas, portanto, não há crime de responsabilidade e sem crime o impeachment é golpe. O estupro da Constituição, realizado escandalosamente por políticos corruptos com a cumplicidade da mídia e do Judiciário, vem sendo condenado em muitos países, não apenas pela imprensa mas, também, por políticos e intelectuais. Parlamentares franceses lançaram um manifesto condenando o golpe e exortando os demais países a não reconhecerem o governo ilegítimo Temer. Nos Estados Unidos o deputado democrata Alan Grayson fez um pronunciamento condenando o golpe e manifestando a sua preocupação com a democracia brasileira, alertando que “o governo interino está implementando as mesmas políticas que foram rejeitadas pela maioria dos eleitores brasileiros: cortando programas sociais, cortando educação, cortando habitação, cortando saúde. Essas eram coisas que o povo [brasileiro] queria. É pelo que eles votaram, e o governo interino mina a democracia negando essas coisas para as pessoas que votaram por elas". Apesar da grita internacional, além das manifestações internas, Temer e seus apoiadores, como a mídia e o Judiciário, se fingem de surdos. E os corruptos que integram o governo interino se comportam como se fossem as mais inocentes das criaturas, aparentemente confiantes de que enquanto estiverem com o presidente em exercício estarão a salvo, entre outros, da Lava-Jato. Na verdade, apesar de alvos de várias delações premiadas sobre o recebimento de propinas milionárias, eles continuam incólumes. Contra o deputado Eduardo Cunha, por exemplo, debatendo-se em meio a uma enxurrada de acusações, o Procurador Geral da República, Rodrigo Janot, pediu apenas que ele devolva uma parte do dinheiro que teria embolsado e depositado na Suiça. Outros, como Aécio Neves e Agripino Maia, embora mais discretos, continuam participando com Temer de conchavos para fortalecer a base do governo interino no Congresso. Pela desenvoltura na movimentação, todos sugerem uma vida sem mácula, mesmo mais sujos do que pau de galinheiro. E são eles que querem tirar uma Presidenta honesta e eleita por mais de 54 milhões de brasileiros.

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