sexta-feira, 29 de abril de 2016

Senado vai repetir a vergonha?

Com a escolha do senador tucano Antonio Anastasia para relator do processo de impeachment da presidenta Dilma Roussef, na comissão especial do Senado, ninguém tem dúvidas de que o parecer será favorável ao afastamento dela. Mas, o que é mais vergonhoso: o Brasil passará mais um vexame diante da comunidade internacional, pois Anastasia é acusado de ter recebido doações das empreiteiras investigadas pela Operação Lava-Jato, além de ter dado, como governador de Minas Gerais, as mesmas “pedaladas fiscais” de que acusam a Presidenta. Graças a essas doações a sua campanha ao Senado foi a mais cara entre os candidatos de todo o Brasil. Diante disso, pergunta-se: com que autoridade moral o senador tucano dará um parecer pedindo o afastamento de Dilma, se ele próprio cometeu os mesmos crimes de que a acusam? Será que vamos assistir no Senado a mesma vergonhosa avacalhação observada na Câmara, onde o processo foi conduzido por Eduardo Cunha, campeão de inquéritos no STF, e votado por muitos deputados acusados de corrupção? O processo, na verdade, nem teria chegado a esse ponto se o senador Renan Calheiros, presidente da Câmara Alta, tivesse recusado o seu recebimento. Como, porém, ele o recebeu das mãos impolutas do deputado Eduardo Cunha, presidente da Câmara Baixa, tem prosseguimento o ritual que culminará com a votação do parecer, provavelmente no próximo dia 12 de maio. A não ser que aconteça algum imprevisto, como por exemplo o Supremo envergonhar-se da sua indiferença e fazer valer a Constituição, a julgar pelo andar da carruagem no mesmo ritmo do registrado na Câmara, a comissão deverá aprovar o afastamento de Dilma por 180 dias até o julgamento pelo plenário. Exposições da acusação e da defesa, tal como aconteceu na primeira fase, foram feitas por mera formalidade, para cumprir o ritual, porque os senadores já definiram o seu voto antes mesmo do processo chegar àquela Casa. Ninguém, portanto, deve alimentar esperanças de que os senadores tenham um comportamento diferente dos deputados (resta saber apenas se eles também dirão “pela minha mulher”, “pelos meus filhos”, etc), porque a disposição de votar pelo afastamento da Presidenta, na Câmara, não resultou de convencimento quanto à prática do crime de responsabilidade – eles sabem que não existe – mas decorreu de conchavos dos dirigentes partidários com os conspiradores do golpe, mais preocupados com os seus próprios interesses do que com os interesses maiores da Nação. Por isso, o advogado geral da União, José Eduardo Cardozo, poderia ter gasto todo o seu latim na defesa de Dilma que a plateia, ou seja, os membros da comissão favoráveis ao impeachment, não ouviu uma palavra do que disse, como aconteceu na comissão da Câmara. Os que são contra o impeachment também já definiram o seu voto, porque têm consciência de que não ha crime de responsabilidade e que, portanto, o processo é golpe. Por mais incrível que possa parecer, porém, tem gente que ainda se agarra a um fio de esperança de que alguns senadores mais maduros, conscientes e independentes possam surpreender votando contra a orientação dos seus partidos e determinando o arquivamento do processo. Mas se isso não acontecer e como ninguém mais acredita na possibilidade de uma intervenção do Supremo Tribunal Federal, que lavou as mãos deixando o barco do golpe correr frouxo sob o comando de corruptos, as esperanças se voltam agora para a aprovação de uma PEC que antecipe as eleições presidenciais para este ano. O movimento pró-eleições cresce nas ruas de todo o país, o que, no entanto, não significa necessariamente que venha a se materializar, embora surja como a única solução para a superação das crises, porque os parlamentares, de quem depende a aprovação da PEC, não costumam ouvir a “voz rouca das ruas” quando elas contrariam os seus interesses pessoais ou de grupos. Deve-se considerar, também, que o principal beneficiário do impeachment, o vice-presidente Michel Temer, que conspirou nas sombras e conseguiu manipular os partidos na execução do projeto que poderá leva-lo pelo atalho do golpe ao Palácio do Planalto, deverá resistir com unhas e dentes à possibilidade de uma eleição este ano, pois a realização do pleito frustraria o seu sonho de ser Presidente sem submeter-se às urnas. Diante disso, ele até já teve o cinismo de afirmar que “eleição é golpe”, declaração avalizada pelo seu escudeiro-mor, senador Romero Jucá, que até pouco tempo foi líder do governo Dilma no Senado. E como ele já provou que tem capacidade para controlar os partidos, conforme se constatou na votação do impeachment na Câmara dos Deputados, aprovar uma PEC sobre eleições este ano não parece tarefa muito fácil, até porque para os parlamentares que aprovaram o golpe pouco importa os problemas do país, desde que os seus sejam solucionados. E enquanto o mundo, perplexo, vê a imagem do Brasil se deteriorar, como decorrência não apenas da aprovação do golpe mas do vergonhoso espetáculo oferecido pelos deputados e transmitido pela TV para todo o planeta (o ex-ministro Joaquim Barbosa chegou a dizer que sentiu vontade de “chorar de vergonha”), prosseguem as manobras para completar o processo de afastamento da presidenta Dilma do Palácio do Planalto. Além da escolha de Anastasia, sem nenhuma condição moral para relatar o processo do impeachment no Senado, o deputado Eduardo Cunha continua movimentando-se, com o aval do Supremo que não decide o seu afastamento, para impedir que o Conselho de Ética da Câmara casse o seu mandato. E os inquéritos contra ele vão se amontoando no STF, sob o olhar complacente dos ministros. Aparentemente estão esperando que o golpe seja consumado e Temer assuma a Presidência da República para votar o afastamento de Cunha, o que, aliás, atenderá também o desejo dos Marinho, conforme manifestado em editorial do “Globo”.

quarta-feira, 27 de abril de 2016

O que mudou na Justiça?

Já vai bem longe o tempo em que se dizia, com enorme respeito, que “decisão judicial não se discute: cumpre-se”. Hoje questiona-se, em todos os recantos do território nacional, até decisões da mais Alta Corte de Justiça do país. O que mudou? O entendimento do povo ou o comportamento do Judiciário? Aparentemente mudou o Judiciário. As mudanças não são recentes, mas elas começaram a ser mais sentidas a partir do julgamento, pelo Supremo Tribunal Federal, do chamado “mensalão”, quando desapareceu a presunção de inocência e a exigência de prova para condenar alguém foi substituída pela “teoria do domínio do fato”. E, também, quando ficou evidente a politização das decisões, pois somente foram julgados e condenados petistas e aliados. Os tucanos ficaram de fora e alguns deles tiveram prescritos os crimes que lhes foram atribuídos. Na oportunidade desse julgamento, que mereceu exagerada cobertura da Grande Midia porque imaginaram que poderia influenciar nas eleições presidenciais, o então ministro Joaquim Barbosa chegou a acusar o seu colega ministro Gilmar Mendes de estar “destruindo a credibilidade do Judiciário brasileiro”, recebendo como resposta uma sonora gargalhada. Na verdade, o próprio Barbosa também contribuiu para a situação de descrédito que se observa hoje, quando a politização se escancarou com a Operação Lava-Jato, não apenas pela seletividade de investigados e vazamentos como, principalmente, pela vergonhosa perseguição ao ex-presidente Lula, contra quem não encontraram absolutamente nada que pudesse incriminá-lo. Até um procurador paulista, ávido de fama, decidiu pedir a sua prisão sem nenhuma justificativa, apenas para ganhar espaço nas páginas dos jornais e nas telinhas da TV. E se deu mal. Ninguém tem dúvidas, no entanto, de que o ex-presidente operário, cujas pesquisas de intenção de votos o apontam em primeiro lugar, continuará na mira da Direita, que deverá intensificar a sua caçada para impedi-lo de disputar a eleição presidencial em vias de antecipação. Segundo o colunista Ricardo Noblat, do “Globo”, “a Lava-Jato dispõe de indícios e provas suficientes para prender Lula por obstrução da Justiça, ocultação de bens em nomes de terceiros e recebimento de dinheiro por palestras que não fez”. Parece piada. Enquanto existem políticos, como Eduardo Cunha, por exemplo, com uma montanha de provas de recebimento de propinas e outros crimes e contra quem não se fala em prisão, querem prender Lula por “obstrução da Justiça”, “ocultação de patrimônio” e “recebimento de pagamento por palestras”. Isso é um deboche e uma afronta à inteligência do povo brasileiro. Na verdade, ninguém é suficiente maluco para decretar a prisão do ex-presidente por esses motivos, porque incendiaria o país, transformado hoje, pelos últimos acontecimentos que culminaram com a aprovação do impeachment da presidenta Dilma Roussef, num barril de pólvora à espera apenas de que alguém acenda o pavio. O seu processo está com o Supremo Tribunal Federal, cujos membros são mais equilibrados, o que, no entanto, não significa necessariamente que ele esteja mais seguro, pois as últimas decisões não lhe foram favoráveis. Como a maioria dos ministros foi nomeada pelo próprio Lula e por Dilma, em cumprimento a dispositivo constitucional, a oposição entendeu que os dois seriam beneficiados por gratidão. A gratidão, sem dúvida, é uma das mais belas virtudes do homem, mas ela não parece fazer parte do dicionário dos ministros. Além disso, ninguém, muito menos Lula e Dilma, quer que eles sejam gratos, mas apenas que eles sejam JUSTOS. E, lamentavelmente, nem sempre se observa a prática da Justiça quando estão em julgamento questões que envolvem o governo ou o ex-presidente. Sempre com o apoio da grande mídia, os oposicionistas, temendo que neste segundo mandato a presidenta Dilma Roussef nomeasse os novos ministros, em decorrência da aposentadoria compulsória de pelo menos cinco dos atuais membros do STF, conseguiram aprovar proposta de emenda constitucional, a chamada “PEC da Bengala”, que aumentou a idade para aposentadoria de 70 para 75 anos. Com isso, deixaram a nomeação para o próximo Presidente da República que, segundo imaginaram, deveria ser Aécio Neves e que, na verdade, pode vir a ser Lula. A iniciativa casuística da oposição, no entanto, não faz o menor sentido, pois os ministros nomeados pelos governantes petistas são muito mais rigorosos em decisões contra eles do que os outros, talvez para provar que não agem por gratidão e, desse modo, não atrair o bombardeio da midia. Embora a politização do Judiciário tenha se revelado de forma escandalosa em várias decisões como, por exemplo, as que suspenderam a posse de Lula no Ministério de Dilma, além da procrastinação no julgamento do afastamento de Eduardo Cunha da presidência da Câmara – o que tem sido causa de críticas acerbas à mais Alta Corte de Justiça do país – não se pode generalizar. Evidente que existem magistrados engajados politicamente, como o ministro Gilmar Mendes e o juiz Catta-Preta que até postou fotos participando de manifestações contra o governo, mas a esmagadora maioria dos membros do Poder Judiciário não embarcou nessa canoa e se mantém fiel aos princípios jurídicos e à Constituição. Prova disso foi o manifesto contra o golpe e em defesa da democracia, assinado por mais de 500 juízes, promotores, procuradores, defensores públicos e advogados, entregue ao presidente do Senado, Renan Calheiros, pedindo a interrupção do processo de impeachment da Presidenta. E ninguém pode acusá-los de petistas. De qualquer modo, o Judiciário precisa urgentemente restaurar a sua credibilidade, em especial o Supremo Tribunal Federal, de modo a recuperar a confiança do povo brasileiro. E o primeiro passo para isso deve ser por um fim na banalização das ações, que hoje se transformaram em brinquedo nas mãos dos opositores do governo com o único objetivo de criar dificuldades para a governante. Recorrem à Justiça por qualquer coisa, para impedir Dilma de viajar, de falar em cadeia de rádio e televisão, de fazer um pouso técnico em Lisboa, de nomear Lula para o seu ministério, de usar um vestido vermelho, etc, etc. Isso não é mais oposição: é esculhambação. O Supremo precisa adotar medidas legais que limitem tais ações, do contrário nenhum governante conseguirá daqui em diante governar em paz, pois, com magistrados engajados politicamente, os seus opositores usarão a Justiça a todo momento como instrumento para infernizá-lo.

segunda-feira, 25 de abril de 2016

Só uma nova eleição

Enquanto o senador vira-lata Aloysio Nunes foi a Washington pedir as bênçãos do Tio Sam para o golpe de 17 de abril, sinalizando o comportamento subserviente e entreguista de um eventual governo Temer, a presidenta Dilma Roussef foi a Nova York denunciá-lo da tribuna da Organização das Nações Unidas. Parcimoniosa em seu pronunciamento, porém, ela não chegou a usar a palavra “golpe”, certamente porque nem precisava, já que o mundo inteiro está consciente da inconstitucionalidade da decisão da Câmara dos Deputados. Os oposicionistas, no entanto, que fizeram enorme gritaria contra a anunciada denúncia da Presidenta – gritaria amplificada pela mídia, em especial a Globo – comemoraram a omissão, atribuindo o fato a um recuo dela diante do seu protesto. Os zelosos líderes da oposição, cuja posição foi endossada pela mídia, justificaram o protesto com o argumento de que a denúncia de Dilma da tribuna da ONU seria prejudicial à imagem do Brasil no exterior. Na verdade, essa preocupação soou como uma piada de muito mau gosto, já que o mundo inteiro sabe do golpe, conforme é fácil constatar pelas mensagens dos chefes de Estado, de solidariedade a Dilma, e pelo noticiário da imprensa mundial. Os diligentes líderes sabem, mas se fingem de desentendidos, que foram eles mesmos que causaram enormes prejuízos ao país com a execução do golpe, transformando a nossa República numa república bananeira e destruindo uma imagem duramente conquistada pelo então presidente Lula que, durante o seu governo, colocou o Brasil entre as grandes potências mundiais. Aparentemente, porém, apesar da denúncia e da posição dos países que condenaram o golpe, nada do que fizer a presidenta Dilma Roussef será capaz de reverter a situação. Primeiro porque, assim como na Câmara dos Deputados, nada do que disser a sua defesa mudará o voto dos senadores, cuja maioria já sinalizou pelo prosseguimento do processo do seu afastamento. E, segundo, porque o Supremo Tribunal Federal que, na qualidade de guardião da Constituição, seria a última trincheira para o cumprimento da Carta Magna, também já sinalizou, através de alguns dos seus ministros, que avaliza o golpe, na medida em que o considera perfeitamente constitucional. Embora o seu presidente, ministro Ricardo Lewandowski, tenha declarado que “a porta do STF está aberta a questionamentos”, o comportamento da mais Alta Corte de Justiça do país diante de algumas ações não deixa dúvidas quanto a sua posição. Além das declarações dos ministros Gilmar Mendes, Dias Tófolli e Celso de Mello, divulgadas pelo “Jornal Nacional”, considerando legal a aprovação do impeachment pela Câmara dos Deputados, antecipando o seu voto face a um possível questionamento, a Corte adiou o julgamento da liminar do ministro Gilmar que suspendeu a posse de Lula no ministério de Dilma, com a justificativa de que era preciso analisar mais duas ações sobre o mesmo assunto. Õbvio que isso era dispensável, pois qualquer que fosse a decisão as outras ações perderiam o sentido. Não parece dificil concluir que o adiamento teve o objetivo de dar tempo para a votação do Senado, pois se a Câmara Alta confirmar a decisão da Câmara Baixa Dilma será afastada da Presidência e a liminar contra Lula perde a sua finalidade. E o Supremo, que até hoje procrastinou a decisão sobre o afastamento de Eduardo Cunha da presidência da Câmara para permitir que ele conduzisse o processo de impeachment, terá feito a sua parte no golpe. Tudo leva a crer que somente após a posse de Michel Temer na Presidência da República é que o Supremo julgará o pedido de afastamento de Cunha, defenestrando-o do comando da Câmara, de modo a evitar que, como primeiro na linha de sucessão, ele assuma o cargo numa eventual viagem do novo presidente, o que seria mais uma estrondosa vergonha para o país. Depois disso, o novo ato da ópera bufa em que transformaram o processo de afastamento da Presidenta terá como palco o Tribunal Superior Eleitoral que, sob a presidência do ministro Gilmar Mendes, provavelmente promoverá a cassação do mandato da chapa Dilma-Temer, acolhendo recurso do PSDB impetrado muito antes de tornar-se aliado do vice-presidente na conspiração e votação do impeachment. Caso isso venha a se confirmar, o Brasil poderá vir a ser presidido por outra mulher, a ministra Carmen Lucia, que vai assumir a presidência do STF. O Brasil, portanto, ainda viverá dias muito difíceis pelo menos até o fim do ano, quando as nuvens no horizonte começarão a perder a tonalidade plúmbea e o panorama nacional mostrará os primeiros sinais de mudança, com a posse, no dia primeiro de janeiro de 2017, de um novo Presidente da República eleito pelo voto popular. Isto porque a única alternativa para o país superar as crises e retomar os trilhos do desenvolvimento parece ser a escolha de um Presidente legitimado pelo povo, através das urnas, em eleições gerais ainda este ano. Sem legitimidade e apesar do apoio da mídia e do Congresso, Temer não terá condições de governabilidade, não apenas pelas dificuldades de relacionamento com os outros países como, principalmente, pelos movimentos populares contra o golpe que paralisarão as mais diferentes atividades em todo o país. Muita água, porém, ainda vai correr debaixo da ponte até as eleições, por conta sobretudo da Operação Lava-Jato. A não ser que Temer consiga, efetivamente, sufocar a Lava-Jato, como esperam os seus aliados, muitos políticos ainda deverão desfilar na passarela dos corruptos, entre eles o senador Agripino Maia, presidente do DEM, que vive apontando o dedo acusador para os outros e acaba de ter quebrado os seus sigilos fiscal e bancário por autorização do Supremo, onde é investigado sob a acusação de receber propinas. O juiz Sergio Moro, que conseguiu predispor o Supremo contra Dilma e Lula, ao divulgar um grampo ilegal, e fortaleceu o processo de impeachment, fazendo também a sua parte no golpe, poderá ser decisivo na seleção dos políticos que participarão da sucessão presidencial e, até, dos candidatos à Câmara e Senado. Por isso, se ele continuar agindo partidariamente vai intensificar a procura de algo, mesmo subjetivo, que possa incriminar Lula, de modo a impedi-lo de participar do processo sucessório. Porque se o ex-torneiro mecânico for candidato ninguém tem dúvidas de que será eleito.

quarta-feira, 20 de abril de 2016

A cara cinica da Câmara

Uma população dividida assistiu domingo, entre perplexa e eufórica, o lançamento do Brasil numa aventura de consequências imprevisíveis. A tragédia não aconteceu, graças a Deus, mas as perspectivas sombrias para um futuro incerto, com o agravamento da instabilidade e da insegurança no país, indicam o surgimento de problemas maiores do que os vivenciados atualmente. A aprovação do impeachment pela maioria da Câmara dos Deputados, portanto, longe de ser uma solução, como pretendem os seus conspiradores e executores, pode levar a Nação ao caos, com a possibilidade sempre presente de uma guerra civil. Caberá ao Senado, já que o Supremo Tribunal Federal lavou as mãos, fazer valer o império da Constituição, interrompendo o processo de afastamento da presidenta Dilma Roussef e devolvendo a normalidade constitucional ao país, consertando a irresponsabilidade de deputados que, comportando-se como colegiais, votaram pelo impeachment como se estivessem na hora do recreio. Apesar da gravidade da decisão, os parlamentares, com honrosas exceções, sorriam e davam gritinhos, como num convescote, projetando para o país e para o mundo uma imagem vergonhosa dos políticos brasileiros. E se transformaram em chacota para a imprensa mundial por conta dos motivos que apresentaram para justificar o voto favorável ao golpe: “Pelo meu pai, pela minha mãe, pelos meus avós, pelos meus bisavós, pela minha esposa, pelos meus filhos, pelos meus netos, pelos meus bisnetos, pelos meus irmãos, pelos meus sobrinhos, pelos meus vizinhos”, etc. Outros foram mais específicos: “Pela minha esposa Paula, pelo meu neto Gabriel, pela tia que me criou, pela minha filha que vai nascer”, etc. Um deles levou o filho para o plenário e queria que ele pronunciasse o seu voto no microfone, no que foi impedido pelo presidente da Mesa, deputado Eduardo Cunha, que não perdeu a sua reconhecida frieza até mesmo quando era chamado de “ladrão” por deputados contrários ao impeachment. Outro motivo sempre citado, de maneira cínica, pelos parlamentares, para justificar o seu voto, foi a corrupção. “Pela ética, contra a roubalheira, pelo fim da corrupção”, bradavam, como se o parlamentar que presidia a sessão, principal responsável pela armação do golpe, não fosse um dos mais investigados do Congresso justamente pelas acusações de recebimento de propinas milionárias e depósitos de fortunas em bancos suiços. Eles teriam sido mais honestos e coerentes com o seu voto se gritassem: “Contra a honestidade, contra a honradez e a favor da roubalheira e da corrupção!”. O que menos se falou, talvez pela consciência de que estavam cometendo uma ilegalidade, foram nas “pedaladas fiscais”, precisamente a causa invocada para promoverem o afastamento da Presidenta. Afinal, eles sabiam que não havia crime de responsabilidade e provavelmente ficaram constrangidos – se é que ainda conseguem constranger-se por alguma coisa – em citá-las como justificativa para o seu voto. Apesar de vergonhosa, sob todos os aspectos, a votação teve o mérito de expor à Nação a verdadeira cara da Câmara, onde pontificam parlamentares infantilizados, mesmo alguns com cabelos brancos, evidenciando ao mesmo tempo um nível moral e intelectual bem abaixo do esperado, o que de certo modo explica a sua obediência à liderança de um espertalhão como Eduardo Cunha, o único que, na hora de votar, disse a frase mais apropriada para o momento: “Que Deus tenha misericórdia do Brasil”. E foi essa Câmara, também recheada de deputados iguais a Cunha, com contas a ajustar com a Justiça, que votou o afastamento de uma Presidenta reconhecidamente honrada e honesta como Dilma Roussef. Ou seja, além de cometerem uma ilegalidade estuprando a Constituição Federal, eles não tinham autoridade moral para uma decisão como essa, o que causou estranheza a observadores e à imprensa internacional. A sessão também revelou à Nação a cara de traidores, como os deputados que assinaram um documento se comprometendo a votar contra o golpe e mudaram o voto na última hora, além de ex-ministros do governo Dilma. Houve também ministros que abandonaram o barco no último minuto, como Eliseu Padilha e Gilberto Kassab, com desculpas esfarrapadas. Alguém já disse que os políticos formam a única classe que desenvolveu o mimetismo, ou seja, a capacidade do camaleão de mudar de cor. São clássicos os exemplos da senadora Marta Suplicy e da ex-senadora Marina Silva, entre outros, que foram carregadas pelo petismo em sua trajetória política e se transformaram em críticas ferozes dos governos petistas aos quais serviram durante muito tempo, posições novas que assumiram não por ideologia, mas por interesses contrariados. Vale registrar, por outro lado, o destemor dos deputados que, contrariando decisão dos seus partidos, votaram contra o golpe, inclusive manifestando sua indignação por ver no comando da sessão um homem sem nenhuma autoridade moral para conduzir o julgamento de uma pessoa sem mácola como a presidenta Dilma Roussef. Infelizmente, porém, são minoria e nada poderão fazer para afastar Cunha da presidência da Casa, pois ele tem o controle da maioria dos oposicionistas, os quais manobra movendo seus cordéis como marionetes. E tudo indica que permanecerá no cargo até o final do seu mandato, pois o Supremo não vota a ação que pede o seu afastamento e os seus seguidores afirmam que ele saiu fortalecido da votação do impeachment. Resultado: o Conselho de Ética, mantido patinando no mesmo lugar por suas manobras, não consegue concluir o processo de cassação do seu mandato por quebra do decoro parlamentar. E se bobearem, ele ainda acaba sentando na cadeira de Presidente da República.

De volta

Estou de volta.